País tem eleições neste domingo, com a direita liderando pesquisas e o ex-presidente Evo Morales defendendo voto nulo 17 de agosto de 2025 | 07:36
Em crise econômica, Bolívia define nas urnas se encerra ciclo de vitórias da esquerda
“Não sei quem vai para o segundo turno, mas acho que os próximos dias não vão ser tranquilos, há muita insatisfação”, avalia o motorista Simón Vega, 55. “A direita não enxerga o povo e a esquerda está em crise, a sociedade não se vê representada nos candidatos e o único consenso é que a economia está mal e que precisamos melhorar.”
A crise econômica que a Bolívia enfrenta permeia as discussões eleitorais. É comum ouvir reclamações sobre a alta do dólar e dos preços dos alimentos, a falta de combustíveis e as filas em postos.
Segundo a pesquisa Ipsos-Ciesmori, feita a pedido da emissora Unitel de 2 a 6 de agosto, o empresário Samuel Doria Medina (Aliança Unidade) tem 21% das intenções de voto, enquanto o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga (Aliança Livre) aparece com 20%. Os demais candidatos têm menos de 10%. O esquerdista Andrónico Rodríguez aparece com 5,5%. A margem de erro é de dois pontos, para mais ou menos.
Se essa tendência se confirmar, as eleições podem encerrar o ciclo de vitórias nas urnas nas últimas duas décadas do MAS (Movimento ao Socialismo), que teve no ex-presidente Evo Morales (2006-2019) sua principal figura.
O MAS dominou a política boliviana nas últimas duas décadas, geralmente vencendo com folga, exceto em 2019, quando Evo buscou um quarto mandato em um processo com alegações de fraude.
Ele acabou renunciando, e o país foi governado interinamente por Jeanine Áñez até 2020, quando o ex-ministro de Evo Luis Arce venceu as eleições com 55,1% dos votos. A relação entre os dois, no entanto, se deteriorou rapidamente.
Em 2025, Evo foi impedido de concorrer e passou a defender o voto nulo. Impopular, Arce desistiu de tentar a reeleição este ano e indicou seu ex-ministro Eduardo del Castillo (MAS),que aparece em sétimo lugar na última pesquisa.
A favor da esquerda, a oposição também chega dividida ao pleito. No ano passado, os candidatos se encontraram para construir uma candidatura única, mas o apoio à unidade se desfez rapidamente.
O novo presidente, independentemente de quem vença, terá que lidar com um país em crise, com inflação de 25% em um período de 12 meses até julho, e uma drástica redução nas exportações de gás, com uma deterioração das reservas internacionais.
“Acho que o mais importante é não nos tornarmos uma sociedade partida, como ocorreu em outros países da região. Os bolivianos precisam se unir e construir planos em comum para que o país siga adiante”, diz a professora Nathália Durán, 32, enquanto espera por um ônibus em El Alto. “Temos 200 anos de história, diversos golpes no passado e precisamos fortalecer a nossa democracia.”
Doria Medina é um economista, multimilionário e ex-ministro que concorre à Presidência pela quarta vez. Ele promete tirar o país andino da crise econômica em cem dias e já se descreveu como “o capitalista mais importante da Bolívia”.
Quiroga presidiu o país de 2001 a 2002, após a renúncia por motivos de saúde de Hugo Banzer, de quem era vice. Ele é um crítico de Evo desde o fim dos anos 1990, quando o indígena ainda era deputado. Defende uma reforma liberal para o país.
Rodríguez, jovem líder cocaleiro e presidente do Senado, é o único candidato da esquerda competitivo. Seus apoiadores apostam que há um voto oculto não captado pelas pesquisas, sobretudo em regiões amazônicas, e que ele pode ser favorecido pelo alto número de indecisos. Em 2020, as pesquisas falharam ao não mostrar a vitória de Arce em primeiro turno.
Além deles três e de Del Castillo, mais quatro candidatos disputam a Presidência: o prefeito da cidade de Cochabamba, Manfred Reyes (Autonomia para a Bolívia); Rodrigo Paz Pereira (Partido Democrata Cristão), filho do ex-presidente Jaime Paz Zamora (1989-1993); o prefeito de Santa Cruz de la Sierra, Jhonny Fernández (Aliança Força do Povo); e o engenheiro Pavel Aracena (Aliança Liberdade e Progresso).
Caso nenhum deles alcance mais de 50% dos votos ou 40% com uma diferença de 10 pontos percentuais para o segundo colocado, haverá segundo turno em 19 de outubro. Os quase 8 milhões de bolivianos habilitados para votar também vão eleger 130 deputados e 36 senadores.
Douglas Gavras / Folhapress