‘Eu mereço’: por que a geração Z não pensa duas vezes antes de estourar o orçamento por pequenos ‘mimos’

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Naomi Barrales agora separa parte do salário especificamente para mimos, como os cookies da Insomnia Cookies, uma rede em Manhattan — Foto: Amir Hamja/The New York Times

A última coisa de que Naomi Barrales, de 25 anos, precisava era de um atraso de 30 minutos no trem. Ela tinha pela frente uma viagem de duas horas até sua casa, em Nova Jersey. Para passar o tempo, decidiu se dar de presente dois cookies veganos de sabor bolo de aniversário.

Isso acabou virando um ritual. Sempre que a assistente de marketing em uma marca de moda tinha um bom dia de trabalho — como receber um elogio do chefe ou acertar em uma apresentação —, ela se recompensava com os mesmos cookies.

Depois, acrescentou um dos refrigerantes prebióticos da Poppi, de US$ 1,50, à sua lista de pequenos mimos. Mesmo quando a máquina de vendas do escritório estava sem o refrigerante e a delicatessen local cobrava o dobro, ela não se importava, porque achava que merecia.

— É algo que eu posso simplesmente ter e não pensar a respeito — diz Barrales. — Não preciso contar moedas.

Ela e muitos outros da Geração Z adotaram a chamada “cultura do mimo”, o hábito de se permitir pequenos luxos — como um café gigante de US$ 12, uma sobremesa de US$ 5 ou um dos chaveiros Labubu de US$ 30 Labubu — para se recompensar ou praticar o autocuidado, mesmo quando esses mimos fogem do orçamento.

Embora muitos jovens da geração não se sintam financeiramente seguros, mais da metade afirma comprar para si algum pequeno mimo ao menos uma vez por semana, segundo uma nova pesquisa com quase mil adultos da Geração Z conduzida pela equipe Better Money Habits do Bank of America.

A ideia de usar recompensas para lidar com dificuldades ou comemorar conquistas, presente há gerações, ganhou força na cultura pop em 2011, em um episódio da série “Parks and Recreation”, no qual os personagens celebravam um dia de cuidados pessoais com o lema “Treat Yo Self” (Cuide de si mesmo).

O que diferencia a Geração Z das anteriores é o modo como eles construíram uma comunidade online em torno dessa tradição, promovendo-a em suas redes sociais como uma forma de cuidar da saúde mental em tempos incertos. No TikTok, compartilham vídeos mostrando seus mais recentes “pequenos mimos” após reprovar em uma prova, fazer tarefas domésticas ou simplesmente para exibir o consumo ostensivo.

A tag do TikTok “sweet little treat meme” (algo como meme do docinho) já resultou em mais de 23 milhões de vídeos. Isso se tornou uma experiência compartilhada, normalizada e celebrada, que incentiva outras pessoas a se permitir algo ou, pelo menos, a se sentir incluídas, analisa Jason Dorsey, pesquisador de gerações e coautor do livro “Zconomy”.

Frustração financeira

Com os custos de vida em alta, um mercado de trabalho instável e marcos financeiros como a compra da casa própria parecendo fora do alcance de muitos jovens adultos, pequenas compras oferecem à Geração Z uma sensação temporária de controle ou indulgência, observa Dorsey.

— Se eu tivesse terminado meus estudos e não estivesse conseguindo avançar na carreira, eu também me daria um mimo — afirma Gregory Stoller, professor na Questrom School of Business da Universidade de Boston, que recebe mais de cinco e-mails por semana de alunos pedindo conselhos de carreira.

Mas, embora esses mimos possam trazer momentos rápidos de alegria, eles também podem levar a gastos excessivos se o orçamento não for bem administrado. Depois de cerca de um mês se presenteando três vezes por semana, Barrales, a assistente de marketing, percebeu que sua conta corrente estava cerca de US$ 50 mais baixa que o normal. Foi o suficiente para soar o alarme.

Angelina Aileen, que se presenteou com US$ 350 em suplementos como forma de autocuidado, em sua casa no Midtown Manhattan — Foto: James Estrin/The New York Times

Angelina Aileen, que se presenteou com US$ 350 em suplementos como forma de autocuidado, em sua casa no Midtown Manhattan — Foto: James Estrin/The New York Times

— No começo, era inofensivo, porque eu pensava: ‘Ah, são só 6 dólares, tudo bem’ — lembra Naomi. — Mas isso se acumula, e é aí que começa a pesar nas minhas finanças.

Entre os jovens da Geração Z que compram mimos, 59% afirmam que isso os leva a gastar demais, segundo a pesquisa do Bank of America. Aplicativos de “compre agora, pague depois” e serviços de entrega instantânea tornam mais fácil do que nunca gastar por impulso, disse Stoller. Muitas vezes, esses “pequenos mimos” são comprados no calor do momento em lugares como padarias ou lojas de roupas, acrescentou.

Tony Park, dono da padaria Angelina Bakery, que hoje tem oito unidades em Manhattan e arredores, observa que os jovens da Geração Z tiveram papel fundamental no crescimento do negócio, que começou com apenas duas lojas há cinco anos. Ele aposta na cultura do mimo da geração com produtos chamativos, como croissants gigantes de US$ 30 e bolos com topos queimáveis que revelam mensagens escondidas.

Mais da metade de seus 11 mil clientes semanais são da Geração Z, calcula o empresário. Jovens adultos podem não ter muito dinheiro no banco, refletiu ele, mas “eles vão gastar com a experiência.”

O que começa como um croissant de US$ 3, no entanto, pode rapidamente virar um gasto de US$ 200 em compras ou ingressos na primeira fila de um show. Para Angelina Aileen, 23 anos, foram US$ 350 em suplementos de autocuidado.

Depois de se formar na Universidade da Pensilvânia em 2023 e conseguir seu primeiro emprego em Nova York, ela imaginava viver sua história digna de filme: novo apartamento, carreira empolgante como analista financeira e passeios de trilha no interior. Mas as expectativas do trabalho e a pressão de acompanhar de perto seu crescimento profissional começaram a sufocá-la. Todos ao seu redor pareciam prosperar, contou Aileen, então ela concluiu que o problema estava nela.

Na tentativa de consertar as coisas, começou a mudar sua rotina, como cortar a cafeína diária, que ela acreditava causar mudanças de humor. Não funcionou. Então, quando uma de suas YouTubers favoritas elogiou uma rotina de suplementos, ela decidiu tentar, comprando produtos que supostamente ajudavam na ansiedade e na energia.

Um mês depois, quando as caixas de assinatura começaram a chegar novamente, Aileen sentiu arrependimento. Rapidamente cancelou algumas assinaturas e adotou uma abordagem mais leve de autocuidado, fazendo mimos menores, como manicure ou massagem duas vezes por mês após o trabalho.

Esses mimos a mantêm com os pés no chão, ela admite:

— Me faz sentir mais preparada para enfrentar as coisas — revela Aileen, hoje gerente de desenvolvimento de produtos em uma empresa de cosméticos.

Alanis Castro-Pacheco também entrou de forma impulsiva na cultura do mimo, durante seu segundo ano de faculdade, em 2022. No dormitório do campus, onde morava com sete colegas, as tensões eram altas. Uma delas levava o parceiro com frequência, apesar do desconforto das outras.

Buscando alívio, a jovem visitou uma loja de instrumentos em Enola, Pensilvânia, sua cidade natal. Por impulso, comprou um baixo e um amplificador por cerca de US$ 500 no cartão de crédito. Imediatamente se arrependeu da compra, mas o dinheiro de Natal e o aprendizado da música “Californication”, da banda Red Hot Chili Peppers, amenizaram o golpe.

— Até hoje, eu ainda vejo [o baixo] no meu quarto e penso: ‘Ok, eu preciso tirar proveito do dinheiro que gastei — conta Alanis. Hoje, aos 22 anos, ela começou a fazer aulas de baixo quinzenais de US$ 75.

Alanis Castro-Pacheco, que a princípio se arrependeu de colocar no cartão de crédito a compra de um baixo e um amplificador de US$ 500, mas agora tira proveito da aquisição fazendo aulas de música — Foto: Maggie Shannon/The New York Times

Alanis Castro-Pacheco, que a princípio se arrependeu de colocar no cartão de crédito a compra de um baixo e um amplificador de US$ 500, mas agora tira proveito da aquisição fazendo aulas de música — Foto: Maggie Shannon/The New York Times

Sua visão sobre os mimos mudou: antes uma ferramenta de enfrentamento, agora são uma forma de celebração. Recentemente comprou uma bolsa Coach para marcar o início de um novo emprego, em julho, como gerente de parcerias estratégicas em uma empresa de mídia social — uma atualização em relação à bolsa da Target que usava antes.

Holly O’Neill, presidente de consumo, varejo e clientes preferenciais do Bank of America, recomenda que qualquer pessoa que participe da cultura do mimo considere estabelecer um orçamento realista ou encontrar alternativas mais sustentáveis, como pegar livros emprestados em uma biblioteca, para que a prática não se torne impulsiva nem leve a gastos excessivos.

Para Naomi, os doces agora fazem parte do orçamento. Ela separa US$ 25 a cada duas semanas do salário:

— Eu ultrapasso o orçamento de mimos às vezes? Sim, ultrapasso. Mas entendendo qual é o meu hábito, é melhor adaptar o orçamento a ele.

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